REFLEXÕES*
Não só os pobres e desvalidos necessitam de caridade.
Às vezes, os nobres e ricos é que são os mais carentes. (*)
Praticar a
caridade para com os desvalidos é importante, mas não o suficiente. É preciso
que se lhe dê não apenas o pão e o peixe, mas o anzol e a técnica da pescaria,
a fim de que ele aprenda a suprir suas próprias necessidades. Essa é a
verdadeira caridade.
Aos ricos e
nobres, cujas necessidades materiais são por demais suficientes, também
poderemos agir através da caridade, levando-lhes atenção e amor, a fim de que
eles descubram que há uma riqueza ainda maior no seio da Humanidade: o amor.
A
propósito, conta-se a história de uma menina que morava numa pequena casa de
tábuas, bem no meio da floresta. Certo dia acordara bem cedo e, insone, foi à
sala, sentou-se no sofá e passou a ler um livro, dentre os muitos que possuía,
quando bateram à porta:
Toc – toc –
toc...
A criança
parou a leitura e foi atender.
Eram três
velhinhos andarilhos. O que se vestia de vermelho falou:
– Minha
filha, por favor, caminhamos, desde a tarde de ontem, estamos sedentos e
cansados. Precisamos de água e abrigo, atenda-nos por caridade.
A garota
olhou os velhinhos e respondeu:
–
Compreendo a situação dos senhores, mas só posso servi-lhes água. Abrigá-los
não consigo porque minha é casa é tão pequena, como os senhores estão vendo,
que mal cabe nossa família.
A menina
pediu licença e foi buscar a água e os serviu do lado de fora, porque sua casa,
como alegara, era de fato muito pequena.
Saciada a
sede, o velhinho de vermelho insistiu:
– Mas,
minha querida, seja compreensiva e perceba o quanto estamos cansados de tanto
caminhar.
– Já lhes
disse que não posso atendê-los, porque minha casa é pequena demais. Mal cabe
minha família. Se fosse um de cada vez, bem que poderia tentar, mas os três, ao
mesmo tempo, não é possível.
– Bem, já
que a amiguinha acha que poderia nos receber um por vez, qual de nós receberia
primeiro?
– Eu nem os
conheço! Quem são os senhores?
– Eu sou
Sucesso. Não vê como sou falante!
– E aquele
outro lá, vestido de púrpura?
– Aquele é
Fortuna, meu melhor amigo!
– E aquele
outro lá, vestido de azul?
– Aquele é
muito velho...
– Sim, bem
sei! Está se vendo pela fisionomia! Como é o nome dele?
– Aquele é
Amor. É tão velho que está quase no fim da vida!
O velhinho
Sucesso voltou a inquirir a menina:
– Vamos,
minha filha, decida logo qual de nós deixará entrar primeiro.
– Deixe
pensar! – disse a garota, colocando o dedinho da mão direita na têmpora como se
estivesse a avaliar a situação. Por fim, determinou:
– Que entre
primeiro o que está vestido de azul!
Assim que o
velhinho mais idoso entrou, os demais companheiros invadiram a sala, fazendo
com que a menina reagisse, expulsando a todos.
Tentando
explicar o acontecido, disse Amor:
– Minha
filha, se existe alguém errado, assumo a culpa.
– Pelo
contrário. O Senhor foi o único que mandei entrar. Pela invasão de privacidade
que seus amigos cometeram expulso a todos, inclusive o senhor.
– Explico
melhor e espero que você entenda. Se a amiguinha tivesse convidado aquele lá,
vestido de vermelho, apenas ele teria entrado, porque ele é Sucesso. Do mesmo
modo, se tivesse mandado entrar o outro, vestido de púrpura, somente ele teria
entrado, porque ele é Fortuna. Mas como você me autorizou entrar na sua casa,
tudo de bom vem comigo: Sucesso, Fortuna... afinal, eu sou Amor.
Naquele
instante a menina estava tão embevecida com as palavras macias do velhinho, e
nem percebeu que, àquela altura, ela já servia mecanicamente cafezinho e
biscoitos aos três viandantes ao lado dos pais dela e ainda havia bastante
espaço na casa.
A partir
daquele momento, a menina aprendeu que não existe casa, por menor que seja, que
nela não caiba Sucesso, Fortuna e Amor, desde que Amor entre primeiro.
Afinal, sem
amor nada é possível. Com amor tudo se torna mais fácil.
(*) Extraído do livro “Amor Eterno”, escrito por Edvaldo Arlégo e
Marileide Tavares, o qual será lançado nos dias 30 e 31 de agosto, no bairro do
Recife, por ocasião do Festival de Literatura do Recife.